A desumanidade do Estado
No passado dia 29 de Janeiro de 2020, sou contactado por uma empresa de consultoria, com o objectivo de participar numa acção de formação de uma IPSS.
Sempre que sou contactado por uma IPSS, tento dentro das minhas possibilidades, estar disponível para as suas necessidades “só perdemos aquilo que não damos”, é sempre uma mais valia, estou sempre a aprender.
Por ter já participado em algumas destas acções, ponho algumas questões, tais como o publico alvo, objectivos a atingir, se é uma acção financiada ou não, etc, etc,…
A razão das minhas questões, deriva de em algumas acções semelhantes e, principalmente em acções financiadas, as informações que me passam não corresponderem à realidade nomeadamente quanto ao grau académico das pessoas que em nada correspondem ao real, só que enquanto as pessoas estão em formação não contam para as estatísticas do desemprego. Bem não quero ir por aí, estou sempre a aprender.
Esta é uma formação ao abrigo da medida cheque formação, Portaria 229 /2015, à qual o CRIAL se candidatou em 2016, o seu inicio foi em 07 de Fevereiro de 2020. Reparem não me enganei, concorreram em 2016, iniciaram em 2020.
Neste caso concreto, todas as informações que a empresa consultora me comunicou correspondem à realidade, é uma acção que me “caiu do céu”, pelos factos que descrevo em seguida.
A acção tem lugar no CRIAL – Centro de Reabilitação e Integração de Almeirim, instituição que serve cerca de 70 pessoas, 20 residentes, com idades entre os 6 e os 66 anos, com deficiências intelectuais e físicas algumas profundas, com uma lista de espera de mais de 50 pessoas.
Trabalham no CRIAL, 65 pessoas, as instalações são fantásticas.
Quando se entra na instituição a expectativa do que se vai encontrar, é largamente suplantada, é um “banho” de humanidade, pela alegria com que os “Meninos” (termo pelo qual são carinhosamente tratados), recebem as pessoas que vem de fora, bem assim, o modo como que as mesmas são tratadas.
Dou comigo a pensar “ouvimos tantas questões, que se dizem importantes!!!!!! venham cá”.
Na formação está uma equipa de 13 pessoas (das 65 que são a equipa CRIAL), que se desafiam diariamente no trabalho para fazer com que as pessoas suas utentes passem um dia melhor.
Passado pouco tempo, as pessoas começam a participar as suas vivências heróicas, sim heróicas, do seu dia a dia, e a minha boca não se fecha perante a enormidade de contrastes e de modos como os seres humanos tem e devem ser tratados.
Várias são as ocasiões em que somos visitados na sala por “Meninos”, várias são as ocasiões em que passando no pátio, sou não confrontado, mas sim abençoado pelos “Meninos”, e dou comigo a pensar “tenho problemas????”.
Lanço muitas questões às pessoas na sua generalidade, faço perguntas umas mais incómodas, e começo a sentir que as pessoas não se sentem nada confortáveis nas suas respostas, não por questões internas mas sim externas. Os olhares trocam-se entre a equipa, voltam-se a trocar, até que “não podemos falar, sabe podemos ser prejudicados, sabe a Segurança Social!!!!!!” falem não tenham receio, “bem, mais tarde”…….
Estou sempre a aprender, mas vem-me à memória George Orwell “big brother is watching you”
A equipa de trabalho é óptima (parabéns a toda a equipa), as instalações são muito boas, existe um cuidado nas mesmas de enaltecer, qualquer boa empresa se gabaria desta instituição, e existe uma lista de espera de pessoas para entrar.
Insisto nas questões levantadas, e vem então as “leis”. Se admitimos mais pessoas a SS obriga a um novo refeitório (o existente digno de qualquer muito bom colégio ou liceu, nunca está com 60% da sua capacidade), a SS obriga a admitir mais pessoas, não de premiar as já existentes de modo a motivar e a incentivar, mas sim admitir novas pessoas, que até já vem possivelmente auferir um ordenado superior, ás pessoas heróicas que aqui trabalham há anos.
Uma empresa cresce não quando acrescenta, mas sim quando não existe nada mais a tirar, mas Estado é Estado.
Existem pessoas necessitadas em lista de espera, a instituição tem condições Humanas e físicas para receber, mas o Estado não deixa.
“big brother is watching you”
Do que vivem estas instituições, neste caso específico o CRIAL?
“Pois, as subvenções da SS, a Câmara que “faz o favor” de nos emprestar o pavilhão, alguns alimentos que nos são oferecidos pelas famílias dos “Meninos”, e algumas poucas empresas que nos dão géneros.”
Escutei, escutei olho para a “obra” e penso, “isto está tudo ao contrário, os valores estão totalmente invertidos”, de louvar as dádivas das famílias e empresas privadas, agora o Estado (SS e Câmara), “fazem o favor????”
Como em todo o lado existem pessoas e pessoas, no entanto, lanço uma ultima questão; “o Director da SS, de quem dependem em larga escala, é com certeza uma pessoa muito presente”, risada total na sala, “sim, sim esteve cá há uns 4, 5 anos,…. esse foi o antigo, agora já existe outro,….”.
Conheço bem a arrogância das pessoas que não saem dos seus “postos” que aí estão algumas delas não por competência mas por se tratar de especialistas da obediência partidária, agora, no mínimo sejam Humanos.
Recordo que as pessoas que estão muito ocupadas sabem, sempre, encontrar tempo para as coisas verdadeiramente importantes.
Tem à vossa porta uma instituição “modelar”, que trata vidas humanas, estão sentados no alto dos seus “postos”, quando deviam estar todos os dias à porta destas instituições a agradecer o serviço que estas prestam às populações.
Uma das principais e primeiras qualidades de um Lider, é o exemplo, é distribuir esperança, é inspirar os outros, é estar aberto a pontos de vista divergentes, não é comandar e controlar, mas cultivar e coordenar as acções dos outros a todos os níveis, e são exactamente estes pontos que não fazem.
Deixem-se guiar não pela vossa importância, mas pelo trabalho que realizam, desçam à realidade, falem com as pessoas, “sejam inteiros”.
“O que conta na vida não é o mero facto de termos vivido. É a diferença do que fizemos nas vidas dos outros que determinará o significado da vida que levamos” Nelson Mandela.
Estou sempre a aprender.
Muito obrigado CRIAL. Força nisso.